Não, não vá embora! Fique aí! Vou te contar
um negócio!
É rápido! Não se preocupe, não vou tentar
te vender nada! Não vai levar dois minutos! É a história sobre como fiquei com
medo de espelhos!
Não! Não é brincadeira! Você pode imaginar
com é difícil para um homenzarrão deste tamanho - que até já domou o touro na
unha! Que já escalpelou “cabra safado metido a besta” sem titubear! - admitir
um troço desses!
Começou na minha meninice, quando eu não
era mais que um botão, lá no subúrbio do Sobral. Meus amigos e eu andávamos
pela rua, quando atravessamos uma loja de televisores. Estava passando o Jornal
da Tarde na TV da vitrine e vi, estupefato, o efeito da vinheta de um anúncio
de um programa de variedades. Faziam aquele efeito legal de uma câmera filmando
uma tela de TV que exibe a imagem filmada pela própria câmera, formando
infinitas imagens.
Ficamos com aquilo na cabeça. Era um menino
muito criativo. Comentei com minha professora que me falou que dava para fazer
o mesmo truque com espelhos. Cheio de curiosidade, perguntei para minha pobre
mãezinha se ela tinha espelhos para eu e meus amigos brincarmos e ela me
respondeu que não prestava brincar com eles. Dizia que provocar imagens
infinitas era um jeito de abrir uma janela para o outro mundo.
Meu pai, mais cético, quis incentivar a
imaginação do filho e deixou que eu brincasse em sua oficina. Ele mexia com
móveis e sempre tinha muitos espelhos de corpo inteiro lá.
Fomos correndo para lá! Infelizmente, com
toda essa burocracia paternal, só a Mariângela me acompanhou. Fomos até a parte
da marcenaria onde ficavam os armários. Estava bem vazia naquela hora, porque
era hora do almoço. Pensei até que, de brinde, ganharia meu primeiro beijo. No
entanto, aconteceu algo assustador que, até hoje não consigo explicar...
Quando viramos os espelhos um para o outro
e avistamos o infinito do reflexo, e também de nossa própria imagem refletida,
vi do fundo do infinito um de meus próprios reflexos se descolando da inércia e
correndo com toda a fúria e velocidade para frente, como se tentasse sair da
prisão de espelhos. Chegou até o terceiro reflexo, até Mariângela sentir seu
nariz sangrar e cair no chão, desmaiada, desalinhando os espelhos.
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