Resgate

Este é um breve relato de nossa pequena expedição à Reserva do Sobral e que teve como objetivo o resgate de 4 caçadores que, a pesar de participarem de atividade ilegal, não podiam ser deixados ao léu no meio da selva.

Somente um conseguiu ver novamente o sol. Dois deles foram localizados de maneira lamentável, pouco ou nada lembrando homens. O outro não foi localizado. De nosso pessoal, apenas uma veterinária foi gravemente ferida. E há de se frisar uma importante e inusitada descoberta, que foi o autor do ferimento de nossa veterinária. E, possivelmente, o autor da morte dos caçadores (pelo menos segundo o que sobreviveu).

A companhia dos caçadores deixou a cidade para caçar uma certa espécie de papagaio rara e fácil de vender. Entraram na reserva no dia 15 do mês passado por volta das 5h30 da manhã e ficaram perdidos por cerca de 20 dias. O sobrevivente relatou que a trilha era conhecida por todos, mas parecia que mudava sobrenaturalmente seus contornos para fazê-los se perder "por vontade própria". Sons de animais desconhecidos e - até certa altura - de veículos só encontrados na cidade foram ouvidos no coração da selva, trazendo grande confusão e aflição a todos. Indo além de tudo que se conhecia.



O sobrevivente foi encontrado desnutrido e com uma quantidade de escoriações incompatíveis com alguém que trazia aquela história. Marcas de ferimentos feitos com objetos cortantes estavam embrenhadas em suas costas. Quando chegou, parecia delirar. Afirmava que alguma coisa teria sido responsável pela desgraça por que passara e que estava escondida de baixo de sua camisa e não queria sair. Afirmava que só continuava vivo porque conseguia impedir que aquilo furasse sua barriga.

Quando conseguimos convencê-lo a largar o volume sob a camisa e erguê-la, ficamos boquiabertos com o que encontramos: tinha um pequeno homem, com aspecto longilíneo e roliço atracado ao seu tronco, como fazem as lagartixas. Com muito esforço, removemos aquilo dele e o colocamos um uma pequena jaula, usada para transportar pequenos macacos.

Ficamos empolgadíssimos com a descoberta! Tratamos logo de comunicar a capital. Era um homem em proporções muito reduzidas. Apresentava os olhos e os cabelos vermelhos como o fogo, dentes com grandes caninos protuberantes e pés curiosamente invertidos, voltados para trás. Seus membros se pareciam muito flexíveis e apresentava restos de ossos saltando a pele na altura dos cotovelos e dos joelhos, formando uma espécie de garra - lembrando bem de leve as que os morcegos têm, colada às asas.

Queríamos tirar algumas fotos, fazer testes de comunicação e reflexo, até que uma equipe especializada viesse da capital para estudá-la devidamente. Nos prontificamos de identificar o habitat da criatura, a fim de localizar mais espécimes, depois que essa equipe viesse.

Depois de uma série de exames, deixamos a criatura na jaula que ficava dentro de um container que improvisávamos como depósito. Não queríamos que ninguém que não precisasse visse aquilo.

Lembro-me bem como me deu calafrios ver a silhueta daquilo em pé, no fundo do container. Dava para distinguir a cor dos olhos vermelhos ainda no escuro. O cabelo, da mesma cor, parecia queimar e se destacava da mesma forma.

Mas como eu relatei, foi nossa veterinária a "afortunada" pela experiência... Ela não gostou nada de termos enfurnado aquilo naquele container em pleno verão tropical e foi ver a criatura. Quando voltou, veio correndo às pressas com metade da pele do rosto pendurada no crânio, saliente, e jorrando muito sangue, chorando num grito de aflição e sofrimento de cortar o coração...

Depois de medicada, nos disse como aconteceu. Disse que entrou e viu a criatura deitada na jaula onde a colocamos. Tirou a temperatura, trocou a água, deu comida e se retirou. Quando se aproximava da porta, ouviu, inexplicavelmente, a voz do próprio filho a chamando chorando, vindo da cela...

Talvez sobre efeito de hipnose, se dirigiu à jaula e a abriu. Tomou a criatura nos braços... O resto é história...

Voltamos ao container e não achamos nada. Aquilo fugiu.

Os especialistas que chamamos deduziram que nossa veterinária feriu a si própria com um bisturi e que a figura que vimos foi o que chamou de "ilusão coletiva provocada pelo calor"...

Mas o que custo a acreditar é na minha própria reação com o tamanho da minha revolta diante dessa constatação:  recorri ao caçador sobrevivente que resgatamos - um homem muito simples sem estudos - mas que parecia saber muito bem do que se tratava e não pareceu surpreso com o meu relato.

Me respondeu sem alardes, depois que contei o desfecho da história:

- É claro que fugiu! É o curupira!

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