O pessoal todo notou a nova moça que
começou a atuar no departamento de vendas.
Era um espetáculo: linda, charmosa, sempre
perfumada. Cabelo liso e bem claro até a cintura, mas que parecia ter sido
ondulado artificialmente. Traços delicados e corpo frágil, mas com presença
marcante: era uma daquelas loiras que ficam muito bem de óculos de sol! E
daqueles bem grandes! Tinha aquele semblante de independência e poder que
só te faz chegar perto se tiver uma alto-estima de deus grego!
Chegava todas as manhãs dirigindo um Azira,
típico veículo grande que a sociedade inventou que é coisa de homem (e bem
sucedido).
Trancava-se em seu escritório sem falar com
ninguém. As pessoas comentavam que as coisas melhoraram muito quando ela
chegou. As vendas decolaram! A moça era muito boa no que fazia. Sua presença
era tão forte e tão marcante que até o "povo do cantinho" (turma
reacionária preconceituosa que existe em toda empresa que se alimenta de ideias
fascistas e que adora reclamar e falar mal dos outros) evitava o chavão
machista de que a única forma de uma mulher jovem e bonita crescer em uma
empresa era sair com o patrão.
E foi Toninho, da turma do cantinho, que,
envenenado pela inveja e pelo o desejo reprimido que destrói o que não pode ter,
começou a tricotar um complô contra a moça. Nunca encontrou um senão contra
ela. Mas procurava! Ah se procurava!
E foi se esgueirando pelos cantos e especulando,
como fazem os donos de língua comprida, que Toninho achou motivo para se calar
e tomar conta da sua própria vida...
Certo dia, chegou uma grande quantidade de
espelhos encomendados pelo Miranda, que estava de férias.
Toninho se esgueirou e sibilou pelo
corredor a espreita como uma naja traiçoeira, só para ver a moça sair para
receber a entrega e espiar sua sala...
A moça saiu e encheu o ar com seu perfume
sedutor e mais delicado que a brisa do ar. E seu nariz empinado fez Toninho hesitar
e se esconder atrás da porta...
E de lá observou e conforme estava ficou...
Ficou vendo a pilha de espelhos descansados na parede, embrulhados por papelão
vagabundo. Viu que alguns deles estavam machucados e que desnudavam alguns
espelhos. Refletiam o entregador separando a nota fiscal e também a moça.
Descuidada, de costas, revelando suas verdadeiras formas: as pernas cobertas de
pelo de animal e os joelhos invertidos, como dois cotovelos dos infernos.
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